21/09/2020
30 anos: SUS resiste a desafios estruturais, desmonte do governo Bolsonaro e pandemia

A promulgação da lei que colocou na prática o Sistema Único de Saúde (SUS) completou trinta anos no último sábado (19). Fruto de um momento de mobilização social único na história da democracia brasileira, o SUS é um dos pontos centrais da Constituição de 1989. Por meio dele, o país tentava corrigir distorções seculares. Ironicamente, desde que passou a existir, o sistema luta por financiamento. Ao mesmo tempo se consolida com execelência em diversos setores, aos trancos e barrancos.
Da invasão colonialista de Portugal, no século XVI, até a redemocratização pós-ditadura militar, quase 500 anos depois, a saúde da população brasileira sempre foi um retrato mais que fiel das desigualdades do país. Ao longo dos séculos, a dinâmica de acesso a quem tinha dinheiro e a negação do direito à população mais pobre se perpetuava com graus diferentes de perversidade.
Se no Brasil Colônia a saúde não era prioridade em absoluto e os cuidados eram baseados no conhecimento de curandeiros e pajés, a estruturação que veio séculos depois não alcançou a todos. Exemplos históricos não faltam e não é difícil conectar os avanços a interesses meramente econômicos.
O início dos processos de sanitização e combate a doenças no país se concentrou em regiões portuárias, uma tentativa explícita de não prejudicar exportações. Os cuidados urbanos vieram acompanhados da eliminação e destruição de cortiços, o que reforçou a exclusão geográfica dos pobres nas grandes cidades.
Pela necessidade se forma a ideia
Na ditadura militar, a assistência só era garantida a quem podia pagar ou a quem tinha carteira assinada e a privatização recebeu incentivos consideráveis. A estrutura pública de saúde era precária, reduzida e destinada a quem contribuía com a previdência. O resto da população estava oficialmente na categoria de indigente. Contava apenas com os poucos hospitais universitários e as instituições filantrópicas.
Em entrevista ao Brasil de Fato, que pode ser ouvida na íntegra, logo abaixo do título dessa matéria, o médico sanitarista, professor e ministro da Saúde no governo de Dilma Rousseff (PT), Arthur Chioro, relata como a saúde funcionava no Brasil até então.
"A saúde não pode ser entendida apenas como assistência. Ela envolve um conjunto de outras áreas sociais", explica Arthur Chioro, ex-ministro da Saúde.
“Antes do SUS, a imensa maioria dos brasileiros que não tinham carteira de trabalho assinada e não contribuíam com a previdência era literalmente considerada indigente. Essas pessoas dependiam da filantropia, das Santas Casas e beneficências e do saber popular, das benzedeiras, da medicina leiga, das ofertas de ordem religiosa. Isso explicava por que o Brasil tinha mortalidade infantil da ordem de duzentos, por que o brasileiro vivia tão pouco e por que as populações eram dizimadas por doenças infecciosas”.
O professor Nelson Rodrigues dos Santos, do departamento de Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), usa a expressão “inusitada pressão pela inclusão social e o direito à saúde” para descrever o movimento que antecedeu à criação do SUS.
Em artigo cedido especialmente ao Brasil de Fato para a citação, ele afirma “Reportando 1990, 1º ano do SUS, metade da população brasileira mais pobre carecia de qualquer assistência à saúde e doença”. A reação só foi possível porque, segundo o professor, havia uma consciência sobre conceitos como “Universalidade, Equidade e Integralidade”.
Essa pressão foi fortemente influenciada pelo movimento de Reforma Sanitária, que na década de 1970 defendia mecanismos de proteção contra a privatização da saúde. Os debates da Constituição Cidadã e insatisfação com a falta de acesso também permearam a demanda popular.
"Nunca ficou tão claro que para a gente ter desenvolvimento econômico, social e proteger a vida da população, precisamos ter um sistema nacional de saúde potente", ressalta Nelson Rodrigues dos Santos.
Sistema único revolucionário
A partir da implementação do SUS, em 1990, começava a tentativa de consolidação da saúde como direito universal no Brasil. Com o novo modelo, qualquer um passava a ter atendimento garantido em qualquer esfera. Antes disso, menos da metade da população conseguia acesso.
As políticas diminuíram a mortalidade infantil em mais de 70%, aumentaram a expectativa de vida do brasileiro, ampliaram acesso a atendimento pré-natal, mudaram os tratamentos para doentes mentais, as ações de combate a doenças e a vida da população em geral.
Foi também por meio do SUS que cerca de 90% dos transplantes do país passaram a ser realizados. Tratamentos de alta complexidade, tecnologias e medicamentos começaram a chegar a quem vivia totalmente à margem. Hoje, todos que procuram a uma unidade do SUS têm direito ao atendimento, independentemente de origem, histórico ou condição financeira.
O Sistema Único de Saúde é reconhecido internacionalmente pelas ações de atenção básica do programa Saúde da Família, por exemplo. A iniciativa atende mais de 120 milhões de brasileiros regularmente. As equipes atuam conhecendo a realidade dos pacientes, prestando orientações frequentes e acompanhamento constante. O reconhecimento vem da própria Organização Mundial da Saúde (OMS), que incluiu o Saúde da Família entre as melhores iniciativas do planeta na área.
É impossível para um país que escreveu na Constituição que a saúde é um direito, imaginar que ela vai voltar para uma lógica de mercado.
É também por meio do SUS que o Brasil oferece acesso gratuito e universal aos tratamentos de HIV/Aids e hepatite, de custo altíssimo. No caso da Aids, estimativas apontam que o sistema alcança cerca de 90% dos soropositivos do país. Em duas décadas, a mortalidade entre essas pessoas caiu mais de 40%.
Soma-se a esses exemplos, um complexo de milhares de hospitais, mais de 50 mil ambulatórios, equipamentos móveis e uma infinidade de profissionais. São cerca de 2 bilhões de procedimentos a cada ano, entre cirurgias, tratamentos, internações, vacinas, campanhas e outras atividades. É possível dizer que o Sistema Único de Saúde representou uma revolução sem precedentes.
Chioro é taxativo ao dizer que considera impossível imaginar uma volta ao passado. "É impossível para um país que escreveu na Constituição que a saúde é um direito, imaginar que ela vai voltar para uma lógica de mercado. Ainda mais quando a gente sabe que a imensa maioria da população brasileira é dependente do SUS para tudo. Nós vamos voltar atrás?"
Investimento sempre foi insuficiente
A lista de revoluções que o Sistema Único de Saúde trouxe para a população brasileira é grande, mas o financiamento destinado a ele nunca foi suficiente. Quando foi estabelecido pela Constituição, havia a previsão de que o SUS receberia 30% do orçamento da seguridade social, o que nunca se efetivou.
“O pior é que, quando a gente chega em 1993, o Ministério da Previdência Social deixa de repassar recursos para a saúde, criando uma situação muito grave", relata o professor da Universidade Municipal de São Caetano do Sul e consultor técnico do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Funcia.
> Clique aqui para ler a reportagem completa no site do Brasil de Fato
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