09/06/2018

20ª Conferência Nacional dos Bancários une trabalhadores em defesa do patrimônio público

Jailton Garcia
(Foto: Jaílton Garcia / Contraf-CUT)
 
A 20ª Conferência Nacional dos Bancários começou, na noite de sexta-feira (8), e vai até o próximo domingo (10), na Quadra do Sindicato dos Bancários de São Paulo, em São Paulo. Representando o Sindicato dos Bancários de Catanduva e Região, participam do evento o presidente da entidade, Roberto Carlos Vicentim, e os diretores Carlos Alberto Moretto, Antônio Júlio Gonçalves Neto, Júlio Mathias e Paulo Franco.

“Nós vivemos um momento bastante difícil. Estamos completando dois anos de golpe e a gente já alertava que o golpe não era contra o PT ou contra a Dilma, mas contra a classe trabalhadora, contra o Brasil e contra a democracia. É um golpe para governar esse país para os ricos” afirmou Juvandia Moreira, presidenta da Contraf-CUT e uma das coordenadoras do Comando Nacional dos Bancários, ao lembrar que depois do golpe, os números do desemprego não pararam de crescer, assim como os números de pobreza e da miséria.

Segundo Ivone, uma das coordenadoras do Comando Nacional da categoria, os bancários farão história mais um ano ao fechar a 27ª Convenção Coletiva de Trabalho (CCT). “Quando entregamos a minuta na mesa de negociação, ela irá muito além da nossa categoria. Nós fazemos o debate de gênero, cotas raciais dentro dos bancos e, também, o debate pelo salário digno para o trabalhador. O aumento que o trabalhador tem todo o ano injeta bilhões de reais na economia do país.

As mesas de debate tiveram início na manhã deste sábado (9) com a contribuição do advogado e professor Pedro Estevam Serrano, que, logo após a aprovação do Regimento Interno, trouxe reflexões sobre a defesa da democracia.

Serrano fez um apanhado histórico do autoritarismo para ajudar a categoria a entender o que está se passando no Brasil nos dias de hoje. “A modernidade nos trouxe, ao menos, dois grandes tipos de Estado regidos por normas. Um é o Estado Democrático de Direitos e o outro é o Estado de Exceção, que poucos falam, mas aparece sempre quando vivemos crises políticas, que acontecem quando há crises econômicas cíclicas”.

Ivone Silva, que presidiu a mesa, destacou a importância da exposição de Pedro Serrano. “A fala deixou muito claro que a elite financeira se utiliza do mecanismo do estado de exceção sempre que há avanços na distribuição da riqueza, ou quando surgem crises que podem levar à redução de seu poder econômico e político para impedir a perda de sua hegemonia. É justamente isso que está acontecendo no atual momento histórico do país”, disse.

Liberalismo X Democracia

O advogado lembrou que teóricos liberais são os ideários da necessidade da suspensão dos direitos para a garantia dos direitos. Thomas Hobbes imagina o homem em estado de natureza em constante guerra. O Estado surgiu para proteger o homem de outro homem. O Estado existia para garantir a ordem e a paz. O ser humano viveria em sociedade para atender seus interesses.

“O Estado poderia suspender os direitos e, inclusive utilizar a violência, quando achasse necessário para a manter a ordem e a paz. É o argumento de convencimento, a grosso modo, utilizado por Bolsonaro”, afirmou o advogado.

Serrano lembrou também de Jonh Locke, o criador do constitucionalismo político, que imagina o estado a partir do contrato social. “Este é o verdadeiro ideal do liberalismo. Com o contrato social estabelece-se a igualdade entre as pessoas, não a liberdade. Para existir a igualdade entre as pessoas não pode existir o príncipe. Todos são tratados como titulares de direitos”, lembrou. Segundo esse teórico, para que uma pessoa ter o direito respeitado, ela precisa respeitar o direito das outras e é isso que traz a paz social e a existência do Estado.

“Precisamos deixar de ter preconceito com o liberalismo de Locke. É ele que diz que, quando o Estado deixa de garantir os direitos, a população passa a ter o direito de a resistir. Quando o Estado passa a agir como soberano, passa a existir o direito à revolução. Não a revolução na concepção marxista, que visa a transformação da sociedade, mas sim uma revolução para restaurar o Estado de Direito”, observou Serrano.

Inimigo interno

A suspensão de direitos era justificada em tempos de guerra, para permitir o ataque aos inimigos. Adam Smith traz isso para o ambiente interno. Ele fala que o inimigo não precisa ser um outro povo, pode ser todas as parcelas da população que promovem a desintegração social, a desintegração do Estado. “O ‘segredo’ do autoritarismo está em manter o povo ‘unido’, sem divisões. Aqueles que pensam diferente desunem o povo. É por isso que hoje, vemos as pessoas afirmando que ‘a esquerda quer desunir a sociedade’. Neste modo de pensar, a democracia divide o povo”.

Serrano explicou que o marxismo é visto como fragmentador da sociedade pois prega a luta de classes e vê a sociedade divida entre patrões e empregados, entre explorados e exploradores. O totalitarismo quer o povo unido e qualquer teoria, qualquer elemento que pregue o contrário deve ser tratado como inimigo e pode ter todos os seus direitos suprimidos. Essa teoria é fundamental para entender o Estado de Exceção.

“O corrupto e o comunista e depois o judeu foram os primeiros inimigos do nazismo. O comunista, neste caso entendesse, não são apenas os comunistas, mas todos aqueles que defendem o estado de direito”, observou.

Forma de solução
Serrano disse que a forma de resolver isso é com a política. “Que acredita na democracia, acredita na forma política e no direito como forma de contestação de poder. Ocorre que, no Estado de Exceção, a parcela da população que busca ‘ordem’ que vê a política como corrupta, como corpo impuro, em contradição à alma purificada. A falácia da pureza moral é grande ambição deste segmento social”, explicou o advogado.

Serrano explicou que esse segmento social aceita a suspensão dos direitos e que as questões sociais sejam resolvidas por meio da violência. Isso fez com que, na América Latina, o autoritarismo seja solicitado e representado por um segmento social e não mais personificado, como ocorreu na Alemanha nazista e na Itália fascista. “O autoritarismo se aperfeiçoou. Não precisa mais do lugar do ditador, que é facilmente atacado. Eles utilizam mecanismo judiciais para estabelecer o autoritarismo e suprimir direitos e mantém a ‘democracia’ funcionando, como se nada estivesse acontecendo”, observou.

O combate às drogas é utilizado na América Latina para se justificar a supressão de direitos de grande parcela da população. No Brasil, a consequência foi o grande aumento da população carcerária. O país é também campeão em número de homicídios, que vitimam em sua maioria a população negra e pobre, em sua maioria jovens que moram nas periferias dos grandes centros urbanos.

“O Brasil não existe guerra, mas as periferias vivem um clima de violência semelhante ao de territórios ocupados. Criaram-se forças militares para se combater o ‘inimigo’. Ao invés de ter ações de guerra o Estado passa a se ter ação de polícia, utilizado as polícias como força de ocupação territorial”, afirmou o professor.

Para o professor, esse tipo de mecanismo de exceção migrou para política, seja através do impeachment ou de processos judiciais, com as lideranças que pensam diferente do estado autoritário perseguidas. “Atribui-se a corrupção aos políticos que pensam diferente. Como não dá para colocar todos os políticos na cadeia, escolhe-se quem se quer estabelecer como corrupto.

Para Serrano, não há corrupção maior do que se apropriar do sentido comum do direito. Para ele, o judiciário está fazendo isso hoje e produzindo um Estado de Exceção.

2ª Mesa: Em defesa das empresas públicas

Com o tema “Em defesa das empresas públicas”, a segunda mesa da 20ª Conferência Nacional dos Bancários discutiu a importância das instituições públicas, como: a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil, a Petrobrás e Eletrobrás, para a sociedade e desenvolvimento do país.

O professor associado do Departamento de Ciências Econômicas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Antônio José Alves Júnior, iniciou o debate com uma análise sobre como os bancos públicos se diferenciam dos privados por sua função social e capacidade de desenvolver a economia do país.  “Na economia que a gente vive, os investimentos de grande porte, como infraestrutura, agricultura, dependem de financiamento, e, muitas vezes, envolvendo atividades arriscadas. O sistema bancário privado entra nessas atividades com o pé atrás e cabe aos bancos públicos ofertar esse financiamento para que haja esse estímulo”, disse.

Uma análise sobre as mudanças ocorridas no sistema público brasileiro alertou sobre práticas do governo que têm como objetivo principal o desmonte das instituições públicas. “As medidas tomadas pelo governo refletem reformas feitas dentro do sistema, mudanças no programa Minha Casa Minha Vida, mudança de política operacional dos bancos, diminuição de participação dos bancos públicos e redução do número de agências. O Banco do Brasil já adotou a política agressiva de redução de postos de atendimentos e o número se aproximou do perfil do Itaú. A Caixa, de modo mais tímido, por ser mais resistente, conseguiu manter um pouco mais o número de agências. Esse quadro é preocupante, pois, invés dos bancos públicos reagirem, eles fazem o oposto.”

Jair Ferreira, presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), lembrou que, durante o governo Lula, a Caixa chegou próximo a 4 mil agências e postos de atendimentos. Conseguiu dobrar o número de trabalhadores, chegando a 101 mil. De 2014 para cá, já somos apenas 88 mil e as agências não para de fechar.”

Ferreira lamentou que a estratégia colocada pela atual gestão do banco, principalmente no Conselho de Administração, é do enfraquecimento da Caixa para transforma-la em Sociedade Anônima (SA). “O golpe está chegando através do Conselho de Administração. Esse é um grande debate que temos de fazer e não permitir que isso aconteça. Pois as empresas públicas existem para ir nos lugares que ninguém vai. Ajuda a desenvolver estes locais, com liberação de crédito, e tenta acabar com a desigualdade social.”

O Conselheiro de Administração Representante dos Funcionários do Banco do Brasil, Fabiano Félix, fez uma reflexão sobre o desmanche executado como política de estado no ataque ao patrimônio brasileiro. “Essa roda de destruição por onde passa não deixa nada além de cinzas. Aquele que se propor a pensar criticamente, primeiro tem que se desarmar para enfrentar o assunto. A forma como o governo Lula, sabiamente, utilizou os bancos públicos foi como instrumento de desenvolvimento. Não basta apenas discutir as estratégias de governança da empresa. Tudo isso se torna efêmero se você não envolve a massa. Com todo o êxito que houve na politica de distribuição de credito e fomento da economia do BB, os lucros que o banco conseguiu não foram suficientes.

Fabiano ainda citou que ao falar em empresas públicas, não se deve pensar apenas em lucro econômico. “Esse lucro é importante, mas não só de lucro vivem as estatais, temos que buscar o lucro dos resultados sociais. Temos de erguer essa bandeira e ir à luta!”

Trabalhadores da Petrobrás e Eletrobrás mostram sua força

Em um momento de forte ataque à Petrobrás, na qual os trabalhadores estão se mobilizando contra a privatização e o aumento dos combustíveis, a diretora da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e secretária de Juventude da CUT, Cibele Vieira, iniciou seu discurso dizendo que “para falar da Petrobras, da importância da empresa estatal, preciso dizer que muita coisa que estamos passando hoje é porque a Petrobras é SA. O que é triste, pois é uma empresa que nasceu de mobilização popular. Nem se sabia que se tinha tanto petróleo no Brasil, mas já se sabia que era um bem estratégico. Não é à toa que eles tiveram que barrar a Petrobras, antes de fazer o golpe. Eles tiveram que criar um crime.”

Para ela, a abertura da Petrobras para as empresas certificadoras terem acesso a tudo foi o início da derrocada da empresa. Em seguida, foi a criação do plano de negócios e a mudança da Lei de Partilha, quando tiraram a operação única da Petrobras. “A disputa é para quem tem que servir o petróleo brasileiro? O dono majoritário da Petrobras é o governo, ou seja, o povo brasileiro. Mas, quando se pensa nos bens e nos lucros, só pensam nos acionistas?”

Ela lembrou que, enquanto antes houve um plano de expansão do refino, agora a empresa não usa nem que produz. “Paralelo a isso, o governo colocou os preços dos derivados de petróleo acima dos internacionais. Fizeram isso para a empresas internacionais entrarem no Brasil e se sentirem confortáveis para comprar a refinarias. Não tem explicação isso que está acontecendo, a não ser interesses escusos de desmontar a empresa.”

Já sobre a Eletrobrás, Esteliano Pereira Gomes Neto, secretário de Administração e Finanças do Sindicato dos Trabalhadores Energéticos do Estado de São Paulo (Sinergia-CUT), comentou sobre a proposta do governo em querer vender boa parte do patrimônio público, sendo 47 usinas hidrelétricas, 114 termelétricas, 114 eólicas e 1 solar, pelo valor de 12 bilhões. “É golpe! Estão entregando o patrimônio público e, além de vender a energia elétrica, estão vendendo a água. Precisamos impedir a entrega do nosso patrimônio, envolver os trabalhadores na luta e, desta forma, já nos programamos para a greve dos dias 11, 12 e 13 em defesa da Eletrobrás, todas as empresas públicas e pela soberania nacional.”

A conferência segue até domingo (10).
 
Fonte: Contraf-CUT, com edição de Seeb Catanduva

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